domingo, 2 de março de 2014

A Prática do Silêncio

A totalidade dos caminhos e técnicas que conduzem ao estado de despertar, que é a vocação do ser humano, falam da mesma coisa de formas diferentes: “calar a mente”. As palavras é que variam, desde silêncio mental, acalmar a mente, presença, atenção, e por aí afora. Vimos isso em Eckhart Tolle, Gurdjieff, Castaneda, mestres budistas, taoistas, etc., e é curiosa a diversidade de caminhos usando o mesmo conceito com técnicas diferentes.
O texto abaixo é de Armando Torres. Poucas pessoas o conhecem, um índio mexicano, xamã e escritor que foi aprendiz de Carlos Castaneda. Em seu livro Encontros Com o Nagual, editado por seu amigo Juan Yoliliztli, de quem fiquei amigo, Armando fala de uma série de temas caros ao buscadores da verdade. Um deles é como praticar o silêncio. O texto é seco como um índio do deserto, mas é no ponto. Cada frase pode ser uma reflexão. Vamos lá:

"Como base para o silêncio mental, Carlos me sugeriu que lutasse contra o que chamou minha "condição doméstica", quer dizer, o fato de que pertenço a um meio social. Referiu-se a isso como um primeiro passo para a liberdade."
"Pôr em relevo nossas interações significa analisar de novo uma grande quantidade de coisas que nós sempre demos por certo, começando por nossos hábitos sexuais, e terminando pelos compromissos familiares, religiosos e cívicos que costumamos contrair. Não se trata de julgar ou subverter nada, mas de observar. A observação, por si mesma, tem um efeito sobre as coisas".
 Eu lhe pedi que explicasse como o ato passivo de observar pode modificar as coisas.
Respondeu que a atenção nunca é passiva por mais tênue que seja, porque é formada da mesma matéria que forma o universo. O simples ato de exercitá-la implica uma transferência de energia.
"É como a velocidade que, ao ser aplicada a um objeto, aumenta sua massa. Similarmente, o enfoque da atenção acrescenta realidade às coisas, e essa realidade tem um limite depois do qual o mundo que conhecemos se desintegra.
"O segredo dos prodígios dos bruxos é a canalização da atenção. Não importa como a apliquem, seja para bem ou para o mal, o que difere é a intenção, não a força do enfoque. Para os novos videntes, a magia da bruxaria não está nos seus resultados, mas nos modos como chegamos a eles. Então, seu melhor intento como aprendiz é calar sua mente".
Quando eu o vi novamente, admiti que embora já levasse um bom tempo tentando seguir seu conselho, ainda não notava  nenhum avanço significativo quanto à realização de um estado de silêncio interior. Pelo contrário, tinha notado que meus pensamentos estavam mais agitados e confusos do que nunca.
Explicou que essa sensação era uma conseqüência normal da prática.
"Como todo novato, você está tentando classificar o silêncio como um elemento a mais de seu inventário de crenças.
"O objetivo de seu inventário foi de fazer com que se desse conta do peso que têm os nossos preconceitos. Usamos quase toda a energia disponível para sustentar um esquema do mundo, e conseguimos isso por meio de sugestões conscientes ou inconscientes.
"Quando um aprendiz é liberado dessa prisão, a sensação que tem é que caiu em um oceano de paz e silêncio. Não importa que fale, cante, chore ou medite, essa sensação permanece.
"Nas primeiras fases do caminho é muito difícil de encarar o silêncio como prática, pois assim que nós descobrimos a ausência de pensamentos, surge uma voz travessa que nos felicita pelo logro. Isso automaticamente rompe o estado.
"O problema ocorre porque você confunde o objetivo dos bruxos com um ideal. O conceito de 'silêncio' é demasiado tênue para uma mente como a sua, acostumada às classificações. É óbvio que você pensou no exercício em termos auditivos, como falta de som. Mas não é assim.
"O que os bruxos querem é algo mais simples. Eles tentam resistir às sugestões, só isso. Se você pode ser o dono de sua mente e pensar corretamente, sem preconceitos nem falsas convicções, você poderá cancelar a parte doméstica de sua natureza. Uma realização suprema.
Caso contrário, você nem mesmo vai entender o que é o exercício.
"Uma vez que aprendemos a eliminá-los, sem nos batermos com eles, nem prestar-lhes qualquer tipo de atenção, os comandos da mente ficarão em nosso interior durante algum  tempo e depois partirão. Assim, não se trata de 'tirá-los' dali, mas de matá-los de aborrecimento.
"Para alcançar esse estado você tem que sacudir seu “inventário de ideias”. Eu pedi que você começasse por suas crenças, mas teria funcionado igual se, por exemplo, você listasse todas as suas relações e afetos, ou os elementos mais atrativos de sua história pessoal, ou suas esperanças, objetivos e preocupações, ou seu gostos, preferências e aversões. O importante é que você se dê conta de seus esquemas de pensamento.
"A magia de todo o inventário está baseado na ordem de seus componentes. Quando nós sacudimos essa ordem, quando falta alguma das peças que nós sempre damos por certo, todo o esquema começa a desmoronar. Assim se dá com as rotinas da mente; você muda um parâmetro e de repente há uma porta aberta onde deveria ter uma parede, e isso muda tudo. A mente se estremece!
"Isso é o que você tem experimentado como uma ativação extraordinária de seu diálogo interior. Antes você nem mesmo o notava, mas agora você sabe que está aí'. Algum dia essa presença será tão pesada que você fará algo a esse respeito. Nesse dia você deixará de ser um homem comum e normal e se tornará um bruxo".

Quem quiser baixar o livro clique aqui:


Nenhum comentário:

Postar um comentário